domingo, 8 de fevereiro de 2009

Do Dogmatismo Evolucionista




Por Dom Robinson Cavalcanti, ose (*)



Com a celebração dos 200 anos do nascimento de Charles Darwin e dos 150 anos da publicação de sua obra “A Origem das Espécies”, o debate criacionismo vs. evolucionismo voltou a ocupar amplos espaços na imprensa, quase sempre marcado pela falta de imparcialidade, e uma boa dose de sensacionalismo. O legado da Idade Contemporânea inclui uma forte herança do cientificismo, ou cienticismo, sistematizado no Positivismo de Augusto Comte (a Teologia e a Filosofia como fases “inferiores” do saber vs. a fase “superior” da Ciência), que influenciou várias teorias, inclusive o marxismo.


Há uma amnésia histórica em relação ao fato de que todas as Universidades do mundo, desde seus primórdios no século IX ao século XIX (cuja exceção foi a Escola Politécnica de Paris, fundada por Napoleão) foram criadas pelas instituições religiosas, com a presença curricular da Teologia, da Filosofia e das Ciências (Da Natureza, Sociais e as ditas Exatas). Enquanto vivemos hoje sob um novo surto de Secularismo (pseudo-Laicismo) que quer empurrar a Religião para fora da esfera pública (Política, Academia), restringindo-a ao subjetivismo individual e ao espaço fechado dos lares e dos templos, vamos testemunhando uma nova valorização da multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade (quebrando do departamentalismo estanque), a revalorização do saber Teológico e Filosófico, e a compreensão dos seres humanos como além-cerebrais, e que o conhecimento inclui o afetivo, o erótico, o místico, o estético, etc., e não somente o racional e o sistemático-verificacional.


O mundo do saber deve ser eminentemente plural. Em cada disciplina há diversidade de escolas e teorias, nenhuma sendo monolítica, e, muito menos, estática, pois todo saber tem um quê de provisoriedade. A liberdade de cátedra, com espaço para a exposição e a crítica, para novas sínteses e novas propostas, é uma marca central da vida acadêmica. Na história do debate entre criacionismo e evolucionismo, tivemos entre judeus e cristãos propostas de evolucionismos teístas e de criacionismos evolutivos, como Telhard Chardin, entre os católicos romanos e Bernard Ramm entre os protestantes.


Enquanto se critica alguns fundamentalistas norte-americanos por serem contrários à inclusão do evolucionismo nas escolas públicas daquele país, no Brasil (e em outros países), são os criacionistas que de forma arrogante, intolerante e dogmática, lutam para proibir, de forma absoluta, a presença do ensino criacionismo em nossas escolas. É a mesma atitude, com sinais trocados.


Não se pode negar que o criacionismo teve rebatimentos além da biologia, com pensadores no campo sociológico e político defendendo um “darwinismo social” (a sobrevivência dos mais fortes e mais aptos), e, com a ausência da intervenção divina e da revelação, resulta em um relativismo moral, com a dificuldade de se condenar a delinquência.


Os criacionistas precisam, urgentemente, de um “choque de humildade”, permitindo uma crítica aos seus postulados na sala de aula, precisam recuperar o valor concreto da liberdade acadêmica, e, mais ainda, o respeito a docentes e alunos, em sua capacidade de investigar, discernir e escolher.


Nós, os retrógrados religiosos, apenas estamos exercendo a nossa cidadania, os nossos direitos humanos, e a nossa defesa da liberdade de expressão e do retorno da Universidade à proposta original que motivou a sua criação por homens e mulheres de fé.



* Dom Robinson Cavalcanti, ose, Bispo Anglicano da Diocese do Recife e escritor, é ex-coordenador do Curso de Mestrado em Ciência Política e ex-diretor do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).